Livros e mais livros (II)

Os Últimos Livros de 2016

  Olá a todos! Antes de mais, quero desejar a todos umas boas festas, com muito amor e muitos doces. Que o espírito do Natal permaneça convosco ao longo do ano inteiro! 
  E agora vou-vos dizer o que farei no post de hoje. Em Agosto, num post intitulado "Livros e Mais Livros", mostrei-vos os livros que tinha lido até então, tendo feito uma pequena resenha e apreciação crítica de cada um deles. Obviamente, desde Agosto até agora, já li mais alguns livros, que partilharei aqui convosco. Este post não vai ser, portanto, um texto com um teor mais lírico como os anteriores, mas espero que gostem e que se sintam tentados a ler as páginas que já tanto me maravilharam este ano. 
  Aqui vamos nós! 

  10 - Os Miseráveis - volume III - Marius, de Victor Hugo



    O volume III da mais conceituada obra do escritor francês Victor Hugo centra-se na personagem de Marius, que vivia com o seu avó, cujo espírito era extremamente conservador. 
  Ao longo deste livro, iremos conhecer as peripécias de Marius, um jovem que se tornará bonapartista e será expulso de casa do avó devido aos ideais que defende. Marius ver-se-á obrigado a sustentar-se trabalhando como tradutor e instalar-se-á na casa Gorbeau, onde conhecerá uma família muito pobre. Essa família é, na realidade, a família Thénardier (sobre a qual falei no post de Agosto!), que se muda para Paris depois de cair na ruína financeira. 
  Os Thénardier veem-se obrigados a pedir esmola a senhores de alta estirpe, embora nunca revelem a sua identidade... Um dia, o pai Thénardier, sem saber, pede ajuda a Jean Valjean, que havia já saído do Convento do Petit-Picpus com Cosette. Jean Valjean decide ajudá-lo e será reconhecido por Thénardier, que deseja vingança por causa de o ex-condenado ter levado Cosette...
  Trata-se de mais um volume apaixonante da obra de Victor Hugo e a melhor parte é, sem sombra de dúvida, o fim! É no final que assistimos à cilada que o Thénardier monta contra Jean Valjean, que deixará Marius num dilema e na qual o polícia Javert irá entrar. As últimas páginas deste livro deixam-nos completamente arrepiados e ansiosos pelo que irá acontecer a seguir! O início é, talvez, a parte mais maçadora, mas vale a pena ler tudo só para chegarmos aos últimos capítulos. 
  Avaliação (de 0 a 10): 9 


11 - Os Miseráveis - volume IV - Idílio da Rua Plumet e epopeia da rua Saint-Denis, de Victor Hugo




  No volume IV d'Os Miseráveis, o autor retrata o ambiente de Paris mesmo antes da insurreição de 1832. Somos levados, pela mão de Victor Hugo, até à capital francesa, onde conheceremos um grupo de estudantes revolucionários que se reunia frequentemente e se preparava, conjuntamente com outros grupos, para encetar uma insurreição contra o poder. 
  É também neste volume que assistimos à consumação do amor de Marius e Cosette, que se inicia ainda no volume III, quando Marius via a bela donzela passear no Jardim do Luxemburgo com o seu pai. O autor descreve com precisão, e usando imagens belíssimas, os encontros de Marius e Cosette, que nos elevam e nos fazem sonhar como se estivéssemos a assistir a um filme romântico. 
  Apesar disso, neste livro, Marius e Cosette desencontram-se e são obrigados a separar-se (ainda que apenas temporariamente), sendo que Éponine (filha dos Thénardier, que estava apaixonada por Marius) vai contribuir para este desencontro... 
  Entretanto, a insurreição instala-se em Paris e constroem-se barricadas nas ruas desta cidade, pelo que Marius, destroçado, vai ter com os seus companheiros para a barricada, onde Éponine morrerá heroicamente para salvar Marius... 
  Penso que o início é a parte mais maçadora de todo o livro... Neste caso, Victor Hugo descreve-nos o ambiente de revolta que pairava na capital francesa, introduzindo alguns pormenores que não são propriamente interessantes. No entanto, quando começamos a assistir ao florescer do amor de Marius e Cosette, o livro torna-se muito mais aprazível. O fim, em que encontramos Marius na barricada, toca-nos especialmente, sobretudo por causa da morte de Éponine... Éponine, apesar de ser filha dos Thénardier, era uma rapariga com um coração puro e dócil, que se havia enamorado de Marius já há algum tempo e que, mesmo sabendo o risco que corria, foi para o meio dos revoltosos disfarçada de homem e morre a salvar Marius. É impossível não ficar emocionado com o gesto de Éponine! 
  Avaliação (de 0 a 10): 9

12 - Os Miseráveis - volume V - Jean Valjean, de Victor Hugo




  E eis que chegamos ao último volume d'Os Miseráveis! Neste quinto volume, somos novamente transportados para junto dos revoltosos que lutavam contra as forças nacionais e vemos aparecer, no meio deles, Jean Valjean, que aí chega por causa de uma carta que não era destinada para ele...
  Jean Valjean destaca-se no meio do combate e ajuda inúmeros homens, razão pela qual lhe é concedido realizar um pedido... Jean Valjean, ao ver Javert, que tinha sido preso pelos revoltosos ainda no início do combate dentro da taberna Corinthe, onde os revoltosos se estavam a abrigar, pede para ser ele a executá-lo... 
  Entretanto, depois de, supostamente, o executar, volta para o combate e, a determinada altura, vendo que o combate já estava perdido e que Marius se encontrava desmaiado e precisava de ajuda, Jean Valjean corre para o auxiliar e carrega-o pelos esgotos de Paris para o deixar em casa a salvo. 
  Jean Valjean consegue sair dos esgotos com Marius, mas será intercetado por Javert, que ele não tinha, na realidade, executado. Javert e Jean Valjean deixarão Marius em casa do avô, Gillenormand, e, no fim, Javert, em vez de prender Jean Valjean, deixa-o em liberdade, num claro desafio aos seus princípios morais e pessoais... 
   Marius vai recuperando as suas forças e Cosette, acompanhada por Jean Valjean, visita-o. Entretanto, Marius e Cosette casam, mas Jean Valjean não consegue esconder o seu passado e continuar a ocultar a sua identidade, pelo que conta tudo a Marius. Marius, chocado, acaba por afastar Jean Valjean, cujo estado de saúde se vai deteriorando...

Avaliação (de 0 a 10): 10

Algumas considerações sobre o último volume/toda a obra

  O quinto volume é um misto de sensações e de emoções! Relativamente a este último volume, só posso dizer que é mesmo o fim perfeito para esta história. Um dos aspetos que mais me tocou foi o esforço hercúleo, excelentemente descrito pelo grande mestre Victor Hugo, que Valjean tem de fazer para carregar Marius ao longo dos esgotos, pois os esgotos são, claro está, locais inóspitos e nem sequer se sabe onde é que as suas imensas ramificações vão parar! Jean Valjean consegue selecionar os caminhos certos e, no entanto, o nosso coração bate com mais força sempre que ele se encontra perante uma encruzilhada...
  Penso que também é importante salientar o facto de Javert ter deixado Jean Valjean partir em liberdade. Depois de tanto ter batalhado para encontrar Jean Valjean, Javert apercebe-se de que o ex-condenado mudou e não é a pessoa que foi. Jean Valjean já não é um criminoso; na realidade, ele redimiu-se e dedicou-se a atos de caridade depois de ter saído das galés. Jean Valjean conseguiu, graças ao abade Myriel (que aparece no primeiro volume) libertar-se do mal que o habitava e encontrar o seu próprio caminho (a partir daí virtuoso). Embora o final de Javert seja bastante trágico, acho que é interessante vermos como esta personagem se liberta, ainda que apenas momentaneamente, dos seus antigos princípios (pode-se até dizer dogmas!), e como se apercebe de que nem tudo é "preto no branco". Quem age de forma errada pode redimir-se e corrigir os seus erros, caso seja ajudado nesse sentido. Javert e toda a sociedade tinham-se esquecido de que o mais importante não era castigar sem dó nem piedade quem havia cometido erros, mas, sim, ajudá-los a encontrar o caminho do bem e da justiça. E o pior de tudo é que Jean Valjean foi preso por causa de ter roubado um pedaço de pão para alimentar os seus sobrinhos... 
  Apesar de o fim ser trágico, a obra Os Miseráveis inspira qualquer um e potencia reflexões brutais sobre a justiça, sobre a bondade e, sobretudo, sobre a sociedade... Quantos de nós não se esquecem daqueles que vivem na miséria? Quantos de nós não pensam sequer no funcionamento do nosso sistema judicial? Quantos de nós é que se importam com a educação e a integração daqueles que cometeram delitos? Um livro que vai ao âmago da condição humana e que nos apresenta os caminhos do bem e do mal! Se quiserem saber mais sobre a obra, vejam este documentário (clica aqui). Nota: este documentário está em português do Brasil, mas considero que a análise que aqui é feita está boa...

13 - Cândido ou O Optimismo, de Voltaire 




  Desengane-se quem pensa que esta obra de Voltaire é muito complexa ou difícil de perceber! Trata-se de um livro muito fácil de ler, pois é, no fundo, um conto de aventuras. 
  Cândido é um jovem muito afável que cresceu no palácio do Barão Thunder-ten-Tronck, tendo recebido os ensinamentos do mestre Pangloss, que defendia que "tudo estava o melhor possível". Porém, Cândido apaixona-se por Cunégonde, filha do Barão, e é corrido do palácio aos pontapés. Cândido é, assim, lançado no mundo exterior, do qual nada conhecia, e tem de aprender a atuar nesse mundo confuso e estranho. Conjuntamente com outras personagens que vão aparecendo no seu caminho, Cândido inicia uma viagem pela Europa e pela América, durante a qual aprende a libertar-se dos ensinamentos do filósofo Pangloss, desenvolvendo, então, um espírito mais crítico e menos divagador. 
  Trata-se de uma obra muito engraçada e que se lê num só fôlego. As aventuras de Cândido, ainda que algo estranhas, ajudam-no a crescer e a encontrar um sentido para a sua própria vida. Através do mestre Pangloss, Voltaire critica, em particular, as ideias do filósofo Leibniz, que defendia a excelência da criação divina, através dos princípios da "razão suficiente" e "da harmonia preestabelecida" e, em geral, as divagações filosóficas vãs que estavam em voga na Europa iluminista. Para Voltaire, mais importante do que discutir teorias particulares é encontrar pontos comuns entre os vários sistemas filosóficos, pois só assim podemos alcançar mais conhecimento e progredir. 
  Recomendo vivamente a leitura, mas deixo aqui um aviso: é importante conhecerem as ideias de Voltaire e a época histórica em que viveu, caso contrário vão-se deliciar com a obra, mas não vão perceber aonde é que ele quer chegar com determinadas críticas... 
  Avaliação (de 0 a 10): 8 

14 - A Educação e o Significado da Vida, de Jiddu Krishnamurti 



  Jiddu Krishnamurti foi um importante mestre espiritual indiano (1895-1986) que "fez apologia da necessidade de a humanidade se desprender do medo, da dor e da tristeza para poder devolver ao quotidiano uma dimensão mais sagrada, meditativa e profundamente livre."
  Neste ensaio, Krishnamurti fala-nos sobre o modelo educativo do Ocidente, considerando que este não potencia o autoconhecimento, razão pela qual os indivíduos se encontram mergulhados na angústia e na incerteza. Segundo Krishnamurti, o modelo educacional do Ocidente centra-se na especialização do indivíduo e no saber técnico, fazendo com que nos tornemos individualistas e nos esqueçamos que os outros são humanos, tal como nós. Os patriotismos, por exemplo, são criticados por Krishnamurti porque eles impõem barreiras entre nós e os outros. 
  Para Krishnamurti, este modelo provoca a ânsia de alcançarmos êxito, seja no domínio espiritual ou no domínio material, sufocando a espontaneidade do ser humano e bloqueando a compreensão inteligente da vida. Porém, inteligência, para Krishnamurti, não tem a ver com conhecimento técnico, mas, sim, com a compreensão e a afeção para com o que nos rodeia e para com quem nos rodeia. 
  Trata-se de um livro brilhante e que qualquer um devia ler: estudantes, pais, professores,... Este ensaio potencia reflexões brilhantes sobre a nossa educação e sobre o nosso modo de vida. Considero que o livro faz propostas muito radicais e até pouco exequíveis; porém, os ideais de Krishnamurti deveriam estar mais presentes nos nossos sistemas de ensino. 
   Como se trata de um livro essencialmente filosófico e é difícil explicá-lo de forma resumida, deixo-vos aqui dois citações fantásticas deste livro para refletirem:

   " É o questionar constante e a equilibrada insatisfação que fazem emergir a inteligência criativa; mas manter a atitude de questionamento e de descontentamento desperta é uma tarefa extremamente árdua; e a maior parte das pessoas não deseja que os seus filhos tenham esta espécie de inteligência, pois é bastante desconfortável viver com alguém que está sempre a pôr em causa os valores estabelecidos." - página 63


  " Se quer que as crianças se libertem dos temores - seja em relação aos pais, ao ambiente ou a Deus -, o educador não pode ter qualquer medo. E esta é a dificuldade: encontrar professores que não estejam apanhados pelas garras do medo. O medo estreita o pensamento e limita a iniciativa, e um professor que tenha medos jamais poderá transmitir o significado profundo de se estar livre de qualquer medo." - página 86

Avaliação (de 0 a 10): 9,5 

14 - O Mendigo e Outros Contos, de Fernando Pessoa


  
  O último livro que li, este ano, foi O Mendigo e Outros Contos, de Fernando Pessoa. Trata-se, como o próprio nome indica, de um livro com vários contos da autoria do maior poeta português do século XX. 
  Neste livro, deparamo-nos com vários contos: uns grandes, outros pequenos; uns mais filosóficos, outros menos, mas todos eles fantásticos. Alguns dos contos são essencialmente monológicos, outros são essencialmente dialógicos. 
  Os quatro primeiros contos são essencialmente filosóficos ou "intelectuais", como lhes chamava Fernando Pessoa. Neles, o escritor do século XX discorre sobre ideias tão importantes como "alma", "ser", "lógica", "felicidade", "mal", "bem", "universo", "verdade", "sofrimento", ...
  O quinto conto, intitulado "O Peregrino", apresenta-nos um jovem que vivia tranquilamente na casa dos seus pais, sem preocupações. Por vezes, quando não estava a ler ou a meditar, dirigia-se até a um muro alto que dava para a estrada onde via passar aqueles que pretendiam chegar à cidade ali próxima e perdia-se a contemplá-los. Um dia, estava ele a observar os viandantes a passar, quando "um homem vestido todo de preto" surge, com o qual trava um breve diálogo, do qual não se consegue recordar... Com o passar do tempo, o protagonista vai-se isolando cada vez mais, deixando de valorizar aquilo que, antes, considerava agradável. Um dia, o jovem recorda-se de uma parte do diálogo com o viandante: "Não fites a Estrada; segue-a" e decide partir. 
  O protagonista empreende, então, uma viagem que se vai alongando e que o leva a travar conhecimento com uma figura feminina da qual se enamora, mas que tem de deixar... 
  A maior parte dos contos que se seguem são contos que acabam por se centrar em figuras muito específicas (a do ladrão, a do filatelista, a de uma mulher), sendo que o autor nos faz entrar na mente delas... Destaco aqui o conto "Maridos" que é um testemunho interessante sobre a forma como as mulheres veem os seus maridos (alerta: é um pouco bizarro!!). 
  O último conto é também um dos meus favoritos e chama-se "Papagaio", tratando-se de um conto de intervenção social com uma moralidade no final. Neste conto, conhecemos o senhor Silva, que se casa com uma mulher extremamente dominadora. O domínio desta senhora sobre Silva é tal que ele passa a "ser um trapo humano" sem personalidade. Mas, um dia, o feitiço vira-se contra o feiticeiro... (se querem saber mais, têm de ler!)
  Avaliação geral (de 0 a 10): 8,5 

   Neste momento, estou a ler o Amor de Perdição, de Camilo Castelo Branco, mas de certeza que só o acabarei em 2017, por isso, posso afirmar que estas foram as minhas leituras de 2016. Espero que vos tenham agradado! Aproveitem e deem-me opiniões, sugestões, ... 

  Um Feliz Natal e um Bom Ano Novo! 

  Nuno Neves

   
   

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