Burocracia, sentimentalismo barato e docência

Perdoem-me os professores que tiraram fotos com alunos e que mostraram as prendas que eles lhes ofereceram neste fim de ano. Perdoem-me porque, efetivamente, têm toda a razão em mostrarem-se felizes, tal como também eu fico de cada vez que tenho uma boa surpresa de um dos meus alunos. Lamento, no entanto, que seja raro isso acontecer. E lamento não vir escrever sobre isso.


Segundo ano a lecionar. Fiquei colocado a dar Francês no final de agosto – YUPI! Apanhei seis turmas – e até gostei bastante delas! – e direção de turma. Não vou comentar o trabalho burocrático-mediador de Diretor de Turma para o qual não tenho paciência absolutamente nenhuma – como se o Ministério da Educação estivesse remotamente interessado naquilo que eu quero fazer. Porque, claramente, não está. Precisa de professores – nem que sejam formados à pressa e para fazerem todo o tipo de tarefas que se encontram nos antípodas da didática e da pedagogia.


Creio que quem ouve falar de burocracia na comunicação social não percebe bem o que se passa nas escolas. Só para terminar um período é preciso escrever uma ata, tirar relatórios de avaliação da plataforma INOVAR (se eles por acaso se dignarem a sair!), verificar duas e três vezes as pautas de avaliação, verificar as medidas de suporte à inclusão e, claro, ter o privilégio de receber emails de pais chateados com a nota final do seu filho.



Mas, como se não bastasse a quantidade ridícula de trabalho de secretariado (não precisava de ter estudado Linguística Portuguesa para isto!) que nós, professores, temos de fazer – em especial os Diretores de Turma -, temos os finais. Os finais de ano letivo. Que, pasme-se, não me suscitam emoções muito positivas. Entre a tristeza de nos despedirmos dos alunos e dos colegas, a exaustão após termos tomado tantas decisões e termos lido tantos papéis e a incerteza de como será o próximo ano letivo e/ou do que queremos fazer no próximo ano letivo, sobra-me pouca vontade de celebrar seja o que for. E atenção: houve aspetos muito positivos e foi um ano infinitamente melhor do que o anterior, mas foi ele o responsável por muitas dores de cabeça e muitas emoções “indesejadas”. Causou-me irritação, desalento e tristeza várias vezes. Irritação pelo desrespeito de alunos e pais. Desalento pelas políticas educativas castradoras e sem cabimento. Tristeza por ver que, se calhar, “isto não é para mim” – não a parte de ensinar, mas tudo o resto.


Às vezes, tento apaziguar-me e digo a mim mesmo: “agora são tarefas mais administrativas, não te preocupes, sempre te podes dedicar a outras coisas um bocadinho mais!”. Mas a verdade é que me preocupo. Preocupo-me porque tudo aquilo que terei de fazer ou que poderei vir a fazer não me oferece a mínima satisfação: reuniões com colegas, reuniões com pais, fazer trabalho administrativo, vigiar exames, etc. 


Gostaria muito de dizer que levo muito desta profissão, mas, neste momento, e para vos ser muito franco, sinto que não é bem assim. Como disse uma amiga minha, “é pena que no fim sobre tão pouco”.


É pena. É pena que o sentimentalismo barato não me sirva. Nem a papelada. 



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